terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

O carnaval, o carnaval...

Num movimento de duas mãos, o carnaval exotiza o Brasil para o exterior e exotiza o Brasil para si mesmo. Abundam nas revistas e na televisão referências à formas excêntricas de ‘brincar o carnaval’ (no melhor do vocabulário global) que têm lugar nos recônditos mais inusitados do território nacional. Fiquei sabendo, por exemplo, que há uma cidade no interior de São Paulo onde se tocam marchinhas de outros tempos durante os três dias de festa; já no Estado de Pernambuco, um pequeno povoado vive, na segunda-feira de carnaval, o dia mais sujo do ano com o desfile de um bloco cuja principal característica é chafurdar no mangue antes do folguedo. Em Salvador, no Rio, em Olinda e, quem sabe, no Recife, não há significativas novidades. As multidões que concorrem às festas dessas cidades-pólo da folia são o grande e violento carteiraço que lhes assegura uma constante cobertura televisiva e o nobre título de medida geral do carnaval brasileiro.

Entre confete, serpentina e ‘muito beijo na boca’ (já diria Ivete Sangalo), o Rio Grande do Sul e alguns dos seus vizinhos desaparecem arquejantes na bruma eufórica da época de Carnaval. Estamos fora da dinâmica geral do Carnaval Brasileiro. Os meios de comunicação não nos acham nem sequer exóticos: já devem fazer boas quatro décadas que Porto Alegre perdeu a distintiva e pedante fama de capital do carnaval de clubes. Em resumo, fomos barrados na Sapucaí. Entretanto, a televisão local (me refiro à RBS, expressão máxima desse tipo de mídia nas pradarias sulinas), argüindo seus sofisticados aparelhos para medição da intensidade carnavalesca, quer espetáculo. “Ah! Agora sim estou sentindo gosto de grupo especial!”, dizia um dos narradores das festividades no Porto Seco, o sambódromo (!) de Porto Alegre. Tal referência foi feita ao suntuoso desfile da Unidos da Vila do IAPI. Meu bom-senso se pergunta: que “grupo especial” estava sendo evocado pelo narrador? O do Rio de Janeiro, quem sabe. Ao longo da transmissão do desfile, escutei outros comentários que faziam referência à melhoria da qualidade das escolas, à necessidade de exclusão das agremiações que traziam apresentações díspares para a avenida, à elevação do nível do carnaval em Porto Alegre. Qual seria, contudo, o ponto culminante dessa ascensão na hierarquia da Corte de Momo? Talvez as ostentosas passarelas do carnaval padrão.

Na medida em que a mídia adota uma unidade (ou algumas unidades) padrão para definir o carnaval brasileiro, abre-se caminho para comparações espúrias e demandas descabidas. Ficamos encurralados entre a ultra-exotização – que “ilustra” a pluralidade de manifestações carnavalescas no Brasil miscigenado – ou a padronização de estilos – caminho obrigatório para as periferias do império de Momo que desejam marcar lugar na apoteose. O risco que se corre com a promoção maciça de certas tipificações é o de alguém chegar à quarta-feira de cinzas sentindo-se despojado dessa riqueza nacional(izante) que se chama carnaval.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Sobre o vídeo

Minha opinião sobre o aborto é carregada de preconceitos ateus, que tento deixar de lado: me coloco a favor desta campanha, do aborto, e de um Estado laico. À parte isso, pergunto: como chegamos neste estágio em que podemos discutir a vida nestes termos? De que forma isso se colocou ao longo do tempo? Onde toda esta liberdade que buscamos, e que supostamente se opõe a uma moral religiosa, vai nos levar? Por que há esta oposição? Às vezes penso que a liberdade se tornou uma obrigação. A legalização do aborto traria realmente mais autonomia para as mulheres? Talvez sim, mas não implica necessariamente em mudanças na configuração machista da sociedade. Achei o vídeo ótimo por questionar as pessoas sobre as conseqüências das suas crenças. Perguntar sempre é um bom começo. Acho que a questão principal talvez não seja garantir ou não um direito, mas sim por que este direito se faz tão necessário (ou não). Talvez nem seja um direito. Mas por enquanto sou a favor.



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