terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Por Cuba




Último dia do ano de 2008. Hoje, à meia noite, o calendário muda de cara e tomamos fôlego para seguir concretizando projetos de vida. Hoje, também a meia noite, a Revolução Cubana completa 50 anos e Cuba ratifica um projeto de vida que contrasta, em termos políticos, com a maioria das realidades nacionais do continente latino-americano: socialismo mestiço, embalado pela salsa, pelo jeito morno e sensual de viver no trópico.


No ano de 2005 viajei à maior das Antilhas. Nos dias que antecederam o vôo a Cuba, estive me preparando para o pior. O pior seria a frustração de encontrar na Ilha a antítese das minhas aspirações com relação à única experiência nacional de construção do socialismo na América Latina. Preparei-me para a ditadura. Ao fim e ao cabo, minha convicção de militante de esquerda, naquela época, não era tão inabalável como pensava. De fato, Cuba desafiou amplamente meus pré-conceitos. A cada dia, se desenrolava com mais nitidez diante de mim um país especial. Nem uma tentativa de soar comunista, ostentar medalhas e pôsteres a moda soviética. Raras foram as manifestações de crença alienada nas possibilidades do regime vigente. Vi agência e protagonismo naqueles que são geralmente tomados por títeres. Não encontrei a Revolução Cubana apenas nas manifestações adesistas dos membros do Partido Comunista. O processo revolucionário emergia com mais nitidez justamente no cotidiano das gentes da Ilha. Gentes que num contexto de agruras, criaram táticas mil para (sobre)viver sem deixar de lado um profundo humanismo que, mesmo colocado em xeque por necessidades quem sabe fundamentais, jamais empalideceu. A Cuba que concebia era bem menos impressionante que a Cuba que conheci. Deixei de exigir dos cubanos que fossem socialistas, para poder, ainda que de forma incipiente, compreender como, diariamente, essa tal Cuba-livre era esboçada, delineada no real. O caráter provocador e criativo dessa cinqüentenária revolução – que começou “verde”, tornou-se vermelha e, aos poucos, incorporou com notável beleza as peculiaridades da sociedade cubana – segue sendo, sem dúvidas, uma possibilidade interessante e em constante atualização.

Na foto, uma das paredes do Acampamento Internacional Julio Antonio Mella, que hospeda as brigadas internacionais de solidariedade a Cuba.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

as putas continuam chegando

Certa vez, num hotel onde estava hospedado com minha namorada, me deparei com uma tosca estante de livros que jazia empoeirada no living do segundo andar. Folheei alguns volumes do acervo e foi quase frustrante perceber que, na sua maioria, eram velhos guias telefônicos ou romances da linha de Sidney Shelton. Contudo, espremidinha entre a papelada vazia, estava a obra que talvez justificasse a existência daquela estante naquele local: "Bukowski: 100 poemas". Depois do furto que fui obrigado a realizar, as prateleiras poeirentas devem ter perdido seu último toque de glamour. Melhor assim. Agora estão completamente mimetizadas com a atmosfera geral da hospedagem que as alberga.

Compartilho com vocês uma partezinha do meu botim:

meninas tranqüilas e limpas com lindos vestidos...
todas as que conheci são putas, ex-putas,
loucas. Vejo homens com mulheres tranqüilas, amáveis - os vejo nos supermercados,
os vejo caminhando juntos pela rua,
os vejo nos seus apartamentos: gente em
paz, vivendo juntos. sei que sua paz
só é parcial, mas há
paz, freqüentemente horas e dias de paz.

todas as que conheci são viciadas nas pílulas,
alcoolatras, putas, ex-putas, loucas.

Quando uma vai embora
chega outra
pior que a anterior.

Vejo tantos homens com meninas tranqüilas e limpas
bem vestidas
meninas com caras que não são lobescas ou
predatórias.

"não tragam nenhuma puta mais para cá", digo para
meus poucos amigos, "vou me apaixonar por ela".

"não poderias estar com uma boa mulher, Bukowski".

preciso de uma mulher boa. preciso de uma mulher boa
mais do que preciso do meu carro, mais do que preciso
de Mozart. preciso tanto de uma mulher boa que
posso saboreá-la no ar, posso sentí-la
na ponta dos meus dedos, posso ver ruas construídas
para que seus pés caminhen,
posso ver travesseiros para sua cabeça,
posso sentir meu sorriso que espera,
posso vê-la acariciando um gato,
posso vê-la dormindo,
posso ver suas pantufas no piso.

sei que existe
mas... onde está ela nesta terra
enquanto as putas continuam chegando?

BUKOWSKI

conversas

Não sei conversar, mas gosto de ouvir. E adoro ouvir pessoas que gostam muito de falar, e conseguem conversar sobre qualquer coisa com desconhecidos, como se fossem pessoas íntimas. Hoje à tarde, viajando de ônibus de Porto Alegre para Caxias do Sul, sentei ao lado de um senhor muito conversador: nunca tínhamos nos visto, mas em menos de cinco minutos ele já me mostrava feliz o motivo de sua ida a Porto Alegre, seus papéis para requerer aposentadoria. Quarenta anos, cinco meses e doze dias de trabalho como policial civil em Caxias. Achava o descanso merecido. Com o sotaque típico da região, falou um pouco mais sobre a correria da véspera de feriado e a dificuldade de conseguir passagens. E então dormiu ruidosamente.
Acordou quando estávamos quase chegando, mas ainda tive tempo de descobrir que ele levou um tiro na perna quando estava em serviço, que tinha só um rim, que Caxias hoje conta com aproximadamente 80 câmeras de segurança espalhadas em pontos estratégicos, que existe um filme chamado 'Pollyanna', que tem um filho engenheiro elétrico que dá aulas no SENAI, que sua filha cursa fisioterapia, e que no final da década de 70 ele lucrou muito com ações, mas por pura sorte.
Ainda me deu uma aula de economia falando sobre a crise americana ("Não que eu seja petista, mas o Lula tá conseguindo segurar bem as coisas agora na crise") e seus impactos. Este assunto lembrou-lhe de um outro filme, que mostrava o drama da crise de 29.
Há esta altura eu já me perdia em meus pensamentos, mas sua vontade de conversar era tanta que respostas monossilábicas o satisfaziam, e o senhor continuava falando, agora sobre a conta de água da sua casa.
Achei muito divertido. Apesar de já ter conhecido muitas pessoas assim, que contam sua vida sem a menor cerimônia, isso ainda me espanta, pois é algo que eu não faria. Mas acho incrível esse compartilhamento.
Despediu-se com um forte aperto de mão: "Foi um prazer, e que Deus te abençoe!".
Se lembra do tempo
que a gente sentia
e sentir era a melhor forma de saber
e a gente nem sabia?

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O inesgotável e agora centenário Levi-Strauss

Em uma de minhas passagens preferidas de Tristes Trópicos, Levi Strauss define assim o trabalho antropológico:

Suas condições de vida e de trabalho o isolam fisicamente de seu grupo por longos períodos; pela brutalidade das mudanças que se expõe, ele adquire uma espécie de desarraigamento crônico: nunca mais se sentirá em casa, em nenhum lugar, permanecerá psicologicamente mutilado. Como a matemática ou a música, a etnografia é uma das raras vocações autênticas. Podemos descobri-la em nós, ainda que não tenha sido ensinada por ninguém.”

 

Embora eu não concorde muito com esta descrição demasiadamente romanceada e purista para meu gosto e também que ela não seja muito condizente com os contextos que eu faço minhas ainda desajeitadas saídas de campo, que longe de me obrigarem a dormir em redes desconfortáveis pelas matas do Brasil central como Levi-Strauss fez, me colocam em agradáveis hotéis com meus incansáveis nativos caminhantes, ela pode traduzir, em algum medida, minha experiência proto-antropológica – especialmente quando fala sobre permanecer psicologicamente mutilado.

Mais do que é carregado em sua própria definição, uma ciência é aquilo que seus cientistas fazem. Se aplicarmos esse princípio Geertziano a Antropologia concluímos que: antropólogos fazem etnografia e é justamente no fazer etnográfico que a alteridade, o deslocamente, a frenética busca para evitar receber o rótulo de etnocêntrico – maior insulto do “antropologiquês” -, que reside, também, o terreno mutilador proferido pelo centenário Levi-Strauss. Isso porque fazer etnografia não coloca em xeque nem nativos nem antropólogos, de modo que o problema não está na propriedade substantiva das coisa mas sim na relação entre elas. Meu dicionário ajuda a falar de outro jeito, alteridade é a natureza ou condição do que é outro, do que é distinto. que queria chegar e parar! De que outro estamos falando? Todo outro pressupõe um nós, e quem somos? E quando os nativos não estão nas matas do Brasil central mas sim em ônibus com você rumo a Porto Alegre, no centro espírita que você freqüenta, ou no clube de mães que sua avó participa? Para onde se deslocar quando o nativo está ali na biblioteca que você retira livros? Quais são as conseqüências de ao se deparar com uma situação como essas correr para a torre de marfim da academia?  

me estendi demais nessas notas, pretendo retoma-las em outros momentos e escrever como e quem está me ajudando a digerir isso

 

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Auto-exílio

Agora, mais do que nunca, a frase que proferiu Eduardo Galeano à época do seu regresso ao Uruguai, depois de dez anos de exílio na Espanha, faz sentido para mim: “Ninguém é herói por ir embora, nem patriota por ficar”.

Cumpro, hoje, o oitavo mês de exílio em Buenos Aires. Fui um dos primeiros em deixar meu país, após consumado o golpe de Estado. Fiz o que estava ao meu alcance durante os primeiros tempos da resistência. Não poderia, logicamente, afirmar que fiz tudo o que era possível, pois seria hipocrisia. Entretanto, o que pude conceber como realizável em meio aquele cenário extremamente confuso e inesperado, foi posto em prática. Levei a cabo uma rebelião solitária que atravessou distintas fases e corrompeu-se, finalmente, com minha tímida aproximação aos partidos políticos ainda não extintos. Essas agremiações, a duríssimas penas, debatiam-se contra as paredes sufocantes da nova institucionalidade, mal conseguindo impingir pequenos reveses ao autoritarismo corrupto já comodamente alojado nos gabinetes de jacarandá da Capital Federal.
Entreguei as armas num dia qualquer de agosto, quando, subitamente, me vi acometido por violenta sensação de guerra perdida e campo arrasado. Nenhum evento especial me levou a abdicar da condição de subversivo interno. Gostaria de poder dizer que o aparato repressivo estava no meu encalço, mas não. Outros tantos nomes encheriam as listas de procurados antes que eu, quem sabe, viesse a ser incluído nos catálogos policiais. Não nego que me apeteceria empreender alguma emocionante fuga do país, contudo, meu embarque no aeroporto, foi dos mais banais: espera de quinze minutos na fila para o “check in”, vinte minutos mais na sala de embarque e, por fim, a decolagem num avião da Aerolineas. Em poucas horas, após viagem sem turbulências, começava minha vida no exílio auto-imposto.

Confesso que durante as primeiras semanas em Buenos Aires, cheguei a questionar a validade da aventura do exílio mas, uma vez que me senti incorporado as fileiras da boemia nativa semi-intelectual , um morno conforto passou a pautar minha vida cotidiana. Sim, transcorrido o primeiro mês em terras estrangeiras, eu já tinha uma rotina , uma cotidianidade. Acordava não antes das dez horas da manhã, tomava café no hotel, comprava o jornal – do qual lia apenas os artigos menos mundanos da seção cultural – e, na parte da tarde, me dedicava a caminhadas mais ou menos demoradas pelo Centro ou por San Telmo.

Do terceiro mês em diante, tomei por hábito gastar as horas interpostas entre o meio dia e o anoitecer num bar-restaurante de Palermo. Ali, fiz amizade com o garçom que, para selar nosso vínculo de camaradagem, deixou de cobrar-me pelo ovo adicional que incrementava os sanduíches quentes do meu café da tarde.

As noites foram preenchidas com porres ocasionais, Haydeé e rasa conversa literária, que entretinha por longas horas a mim e aos meus amigos. Causava-me certa graça observar o entusiasmo e o orgulho com que alguns me apresentavam aos demais membros do seu círculo de relações como “exilado político”. Percebi que, naquele meio social, ter proximidade com portador de semelhante título de nobreza era um potencializador de status. Como nesse sistema de trocas simbólicas eu só tinha a ganhar, dramatizava com exagerada veemência o papel de lutador social desterrado pelo Estado autoritário. Por vezes, me soava medíocre a maneira como todos se mobilizavam para dar legitimidade a minha vulgar atuação. Quiçá só eu visse as coisas daquela forma, precisamente por conhecer muito bem o pequeno-burguês acomodado que se ocultava com ardil sob a roupagem de intelectual engajado.

No décimo dia de cada mês, recebia algum dinheiro em minha conta do Banco de la Nación. Tais ingressos eram fruto da preocupação do núcleo familiar com meu bem-estar. Vez que outra, conseguia vender fotografias para um órgão alternativo de imprensa que desenvolvia atividades no meu país e desferia ácida crítica a ditadura. Isso subsidiava a manutenção do meu equipamento de trabalho, bem como da minha rotina de bares. Poucas vezes me animei a sair de Buenos Aires. Entre minhas escassas incursões a outras partes da República Argentina, confiro especial destaque a uma viagem realizada à província de Corrientes para registro fotográfico do culto a santos populares da região. Os custos dessa pequena expedição foram cobertos por uma revista etnográfica de Oluapãos, a grande metrópole da minha terra natal. Recebi, por correio, um exemplar da publicação acadêmica. Nela, estava em destaque o artigo ilustrado com as fotografias creditadas a Martim Assunção, “correspondente no exílio”. Ao percorrer com os olhos essas palavras, não pude deixar de esboçar sorriso sutil e parcialmente irônico. Logo de duas ou três menções ao meu nome nos periódicos da “contra-mídia combativa”, chegava a minha caixa de e-mails vetusta quantidade de mensagens: estudantes aduladores externando solicitude com respeito as minhas intervenções na imprensa alternativa; outros exilados buscando a formação de redes de apoio e resistência no exterior; convites para escrever artigos ou enviar imagens. Em fim, nada que me comovesse especialmente.

Hoje pela manhã, percebi que meu cotidiano exalava o cheiro do marasmo. Questionei pela segunda vez a viabilidade do auto-exílio. Ainda ébrio pelo Fernett, comprei passagens de volta ao meu país, pois o regresso se me apresentava como única alternativa ao devir enfadonho que, não tão longe, se delineava. Liguei para Oscar Aldunate, um amigo uruguaio com quem compartilhara idéias semelhantes e um mesmo apartamento, meses antes de partir ao desterro. Queria que ele me colocasse a par do que estava acontecendo no pago que havia deixado há meses. Ademais, necessitava alguma manifestação efusiva de satisfação diante do meu retorno e, bem sei, Oscar é afeito ao exagero, sendo assim, me pareceu capacitado para tal tarefa. Não posso negar que recebi com surpresa – obviamente menor que aquela performatizada por mim durante o diálogo telefônico – a notícia da inclusão do meu nome na lista de procurados pela Polícia Federal. Como se não bastasse, o Ministério de Relações Exteriores da ditadura, fazia uma semana, conferira-me o título de persona non grata, impedindo-me, portanto, de pisar em solo nacional. “Lo siento Hermano, pero si querés volver a este país, tendrás que cruzar la frontera a pie y disfrazado de vaca. Te puedo ayudar si querés”. “Lo voy a pensar, Oscar. De todos modos, gracias”. Desliguei o telefone, ganhei a rua e senti o sol brando de março na cara. Minha mão, quase involuntariamente, deixou cair ao chão a passagem de retorno. Sentei-me no meio fio, acendi um cigarro e desejei que ele nunca terminasse.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

E agora que sou professor?

Engraçado é pensar que hoje sou professor. "Professor! quem diria!?"

Parece tão certo, tão definido: você é professor e pronto, o que faz é ensinar. Parece não ter discussão, as pessoas concordam com isso, eu concordava com isso. Parecia simples até que percebi que tenho em mãos um poder muito grande, ora, mire e veja, os alunos já chegam preparados para receber de mim algum tipo de conhecimento, eles esperam isso. Mães confiam em mim para educar seus filhos!
O que eu ainda não havia me dado conta é que eu posso escolher o que ensinar para eles. Antes parecia simples: eu escolheria os assuntos referentes aos respectivos anos, preparava algumas aulas práticas, umas saídas de campo e pronto. Meu currículo estaria muito bom. Mas aí parei e pensei.
Comecei me perguntando como deveria guiar as minhas aulas para que elas fossem diferentes das outras, para que fossem melhores e dentro das minhas divagações me deparei com outra pergunta, anterior essa, que me revirou, ainda mais, por algumas meia-horas na cama. Precisava definir, antes de decidir como ensinar, o que ensinar e não estou dizendo que fiquei na dúvida entre falar dos ecossistemas ou das transformações de energia em sistemas fechados. Era algo maior que levou algum tempo para que eu pudesse definir. Estava em dúvida se o que eu trabalharia com eles eram os conceitos tradicionais com avaliações periódicas de desempenho do aluno, as velhas aquisições de conhecimentos e memorização de conceitos básicos ou mergulharia no vasto mundo das possibilidades. Possibilidades de trabalhar o conceito contextualizado no mundo muitas vezes pequeno do aluno (papo de "professor-cult"), de trabalhar relações de produção, conscientização, emancipação, identidade, subjetividade, saber-poder, gênero, raça, etnia, sexualidade, multiculturalismo etc. Por um lado me senti fortemente impelido a montar um currículo diferente dos que tinha conhecido até então e, de fato, embrenhei-me na proposta. Mas aí parei e pensei.
Antes de definir o que trabalhar com os alunos, antes de definir os métodos revolucionários que eu estava planejando usar, antes de tudo isso eu precisaria definir um objetivo para esse currículo. Minha primeira resposta para essa pergunta foi rápida: o objetivo do currículo é o aluno. Mas minha cabeça, que não para de me questionar, logo me interrompeu. "Mas qual aluno?" e foi aí que me perdi nas idéias. Antes de definir o que eu quereria discutir com os alunos e como quereria trabalhar com eles precisaria definir o que eu buscava com essas escolhas, lembrando que as conseqüências delas não serão sentidas por mim, mas por eles.
Passei horas no trânsito introspectivo de São Paulo com o rádio desligado e os vidros fechados pensando o que eu queria criar. Os meninos e as meninas deveriam sair do ensino fundamental repetindo aqueles conceitos científicos como se fossem salmos de um grande livro grosso? Deveriam sair prontos para pensar e construir as próprias idéias num mundo em que o tempo para isso é luxo de poucos (que não sabem usá-lo)? Deveriam sair críticos e desconfiados de tudo e de todos? Deveriam sair com consciencia social e ambiental? Deveriam sair como? Mas aí parei e me peri.

fui tomado de angústia, olhei ao redor procurando qualquer alguém, mas estava sozinho como se fosse um paulistano...

pensei em perguntar aos alunos o que eles esperam das aulas, mas pelo pouco que conheço do mundo escola-casa-computador a resposta poderia ser um tanto quanto frustrante.
Se é que me entendem....

ok, obrigado.
Aqui foi meu desabafo...

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Sexualidade e Machismo na Banda Oriental ou "das percepções que plasmei com Paula na mesa do bar"

Paula Vega, doutoranda em antropologia, uruguaia magrinha e morena, chegou por volta das 20h no Hostel. Eu estava na salinha de TV, aproveitando o calor da lareira. Naquela noite conversaríamos um pouco a respeito da minha investigação sobre migrações, uma área de interesse que ambos compartilhamos. Coloquei uma manta e ganhamos a rua gelada, Paula me levou ao Lobisón, barzinho enterrado num porão, ambiente aconchegante e vazio, como a maioria dos botecos de Montevidéu em plena semana. Pedimos cerveja negra e aos poucos o diálogo fluiu. Fluiu e dilatou-se, incorporando outros temas, entre eles, sexualidade e machismo. Quero compartilhar com vocês algumas das percepções que surgiram naquela mesa de bar.

Aos solteiros, homens ou mulheres, faço um rápido esclarecimento: se tiverem planos de viajar ao Uruguai, mais especificamente a Montevidéu, não desanimem. Os apontamentos eventualmente desestimulantes que podem aparecer nas linhas seguintes são fruto de observações quase desinteressadas, reflexos de experiências pessoais, projeções que beiram o perigoso generalismo.

Há tempos me chama a atenção o fato de as mulheres uruguaias serem menos extrovertidas e extravagantes que suas congêneres brasileiras em diversos planos, inclusive no da performance sexual. O sexo, ainda que ronde as mentes orientais (gentílico para os nascidos na República Oriental do Uruguai) com tanta intensidade como ronda as mentes tupiniquins, aflora de maneiras distintas no cotidiano dos uruguaios. Expressar atração sexual mediante trova (ou, como preferem os paulistas, xaveco) é uma aventura e um risco que praticamente está negado a moça nascida na margem norte do Rio da Prata (talvez coisa semelhante ocorra na margem Sul, em Buenos Aires, mas esse é assunto para outro momento). Durante nossa conversa no Lobisón, Paula passou em revista uma série de situações por ela vividas onde ficou patente o desconforto dos homens uruguaios diante de situações nas quais o apetite sexual feminino pudesse romper com a lógica natural. Esta lógica natural é a que coloca o potente varão como único ocupante do lisongioso posto de conquistador, sedutor de multidões. No Brasil a prática dominante também aponta neste sentido, entretanto, novos discursos – dos quais não me arriscaria a conjeturar o teor de hipocrisia – têm ganhado visibilidade e alcançado legitimação. O que chama a atenção no Uruguai, entretanto, é o amplo respaldo social auferido ao mais escrachado machismo. Paula alertou-me, por exemplo, para o teor das “cantadas” recebidas pelas mocinhas nas ruas e bulevares da capital uruguaia. Usando como comparação os gracejos masculinos correntes em terras brasileiras, minha companheira de mesa identificou, nas cantadas uruguaias, um conteúdo bem mais violento. Para Paula, as manifestações verbais de atração sexual nas ruas do Brasil soam muito mais como um “convite”, uma “proposta” - que pode variar no seu teor desde um comedido “casa comigo” a um despudorado “vem cá que eu vou te comer”. Já no Uruguai, as cantadas teriam uma marcada conotação de diminuição da mulher, de esterilização social: “puta”; “te voy a garchar”; “mirame, putita”; “está buena la perra”.

No âmbito das relações entre companheiros de trabalho, também a conduta da uruguaia está cuidadosamente vigiada, a mercê de uma série de qualificativos nada prestigiosos. Sair com alguém com quem se divide o mesmo ambiente de trabalho é algo delicado. Nem sempre, o fato de uma mulher beijar um homem significa que está disposta a partilhar com ele todos os dias da sua vida até o último. Contudo, na Banda Oriental, o compromisso, a relação baseada na fixidez, é altamente desejada, sendo interpretada como desdobramento natural de uma boa noite de sexo. Obviamente o desejado, o legítimo, em diversas ocasiões não pauta a totalidade das práticas sociais. Arriscar-me-ia a dizer, inclusive, que a maioria das condutas não reflete o socialmente desejado em sua integridade. Há margens de diálogo e espaço para a astúcia. Todavia, nos escritórios e talvez salas de aula uruguaias, as margens para a divergência são bastante policiadas e o discurso dominante acena com a arma da rotulação quando limites são forçados. Na opinião de Paula, um dos mais poderosos e difamadores adjetivos aplicados a mulheres que experimentam alguma rotatividade de parceiros e acabam sendo descobertas – e num clima de fábrica, escola ou escritório as “descobertas”, tornadas públicas, podem ser altamente lucrativas– é “atorranta”. “Atorranta” significa “vagabunda” quando aplicado a mulheres. Contudo, um homem “atorrante” é apenas um “chato”. Investida da condição de “atorranta” uma moça já não pode ser levada a sério, perde prestígio, pode ver comprometido seu capital social. No Uruguai, Paula me comenta que está sujeita uma série de adjetivos que no Brasil, apesar de vigentes, não se aplicam tão maciçamente: por ter cabelinho curto, é lésbica; por não possuir parceiro fixo, “atorranta”; por ser intelectualizada, é temerária para muitos. Não pude deixar de me lembrar do comentário que ouvi de um amigo a respeito de suas exigências no mercado matrimonial: “prefiero mujeres huecas” (prefiro mulheres ocas). Juan, conhecido meu, gay, lamentava: “me da asco estar con otros hombres, aunque me gusten, porque fui enseñado a odiar a los homosexuales” (tenho nojo de ficar com outros homens, ainda que eu goste deles, porque fui ensinado a odiar os homossexuais).

As franjinhas deitadas sobre um dos lados do rosto, os sapatos baixinhos, uma simpatia sincera, mas cuidadosamente manobrada de modo a não escorregar em malícia, são característica de muitas meninas uruguaias entre doze e vinte e poucos anos. “Cuando se vuelven más viejas, tienen más actitud” (quando ficam mais velhas, têm mais atitude), avaliou alguém. A punheta é instituição altamente definidora da adolescência. Mas há meninos uruguaios que se queixam de, aos vinte anos, ainda não terem superado essa etapa da juventude no que tange a ampliação dos horizontes sexuais. Mais sorte têm os “muchachos” do campo, que podem contar com o tradicional “debut” de prostíbulo e com os concorridos traseiros ovinos. “Después uno se resigna”, afirma Homero, olhando tristemente para o chão, “se resigna y aprende a esperar a que se le cruce una veterana” (se resigna e aprende a esperar até que uma veterana cruze seu caminho). Estabelece-se, assim, um tenso e engessado marasmo sexual corroborado por homens e mulheres de forma mais ou menos consciente.

“Brasil es el paraiso sexual!”, exclamou Paula já no final da última garrafa de Patrícia Negra. Concordei sem reservas.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

No Canada...

Fui perguntar informacao (me perco mtoooooo aqui) para um senhor... devia ter seus 55 anos...

"- Com licenca...
- Estou ocupado. Va embora. Va embora. Estou ocupado."

Quando contei isso a alguem la....

"Jura que isso eh ser rude no Brasil?"
.
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.
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Entrando em um restaurante, procurando emprego, um cara me perguntou na porta se eu tinha um isqueiro. Eu disse que nao. Ele perguntou se eu estava indo jantar. Eu disse que nao, que estava procurando emprego.
Quando sai ele comecou a perguntar se eu tinha arranjado o emprego. E comecou a fala um monte de coisas e eu nao entendia nada... Eu nao sou la grandes coisas no ingles, nem ele... E o sotaque dele era mto dificil.

Eu so perguntava o que? Nao entendo...

A conversa sem pe nem cabeca, daqui a pouco achei esquisito e perguntei: vc quer fazer sexo comigo? Ele respondeu, nao!!! So beijo e tocar.

Eu disse... AAAHH!! Nao! Nao eh esse tipo de emprego que to procurando, penso em garconete, coisas assim.

Ele comecou...
Por favor... ok! Entao nao 1 hora... 30 min...
e eu andando tentando sair de perto dele. Ele me acompanhando....
Nao!
Ta 400 dolares.
Nao!
Ok! So beijo entao.
Nao!

Ele parou, os olhos encheram de lagrima.
Por favor, me da um beijo. Tenho 500 dolares, eh tudo que posso te dar. Sou coreano, nao tenho namorada, e tb nao tenho mto dinheiro. Estou mto sozinho. Por favor, me da um beijo.

Eu disse que ele nao precisava fazer aquilo, que poderia ficar com alguem, arranjar alguem, sem ter q usar dinheiro.

Ele abaixou a cabeca disse nao, e saiu andando apressado, como se tivesse com vergonha de mim.

Eu fiquei andando num ritmo super lento atras.

Ele olhou para traz  vezes.

Eu nao entrei em mais nenhum restaurante nessa noite.

Chegando...

Atrasada, mas to chegando.

Ok, estou viajando, no Canada. Vou usar daqui para fazer uma especie de diario de bordo, ou talvez so relato de algumas impressoes que preciso dividir, pelo menos por enquanto. Se nao se incomodarem. Sempre que possivel postarei (o que nao vai ser mto frequente, nao to com mto tempo, e tb quero uma certa distancia do portugues nos proximos 4 meses).

No metro, repleto de anuncios publicitarios no alto, de assento vinho aveludado, uma mulher, despenteada, com uma saia longa africana, e todos os casacos que sao necessarios aqui, entrou correndo, recitando poemas com expressoes e jogadas de corpo de performance teatral. Tinha um tique de passar o antebraco na testa. Quando passou em frente a mim, parou, olhou minhas maos, meus pes, meu cabelo, minha boca, minha bolsa, mas nao meus olhos. Como se enxergasse atraves de mim, desfocando os olhos balancou a cabeca como se fosse um pendulo, hipnotizada. Acordou. Num movimento brusco, retirou da grande e pesada bolsa de couro ja desgastada, um livreto de capa preta, impecavelmente novo. Antes de me entregar, retirou uma rosa vermelha, murcha, cujas petalas devem ter sido distribuidas por onde ela passou, talvez dentro da bolsa de couro. Com a flor em cima do livreto, como num pacote, ganhei o presentei. O sinal de que as portas iriam se fechar soou, ela saiu correndo.

O titulo? Nao tinha. Na contra capa, uma folha em branco assinada em letra de mao "Brigida Kalu".

Algumas das coisas que estao escritas la, vou passando aqui...

"Para um video de um amigo...

Corpo de 5 sentidos.

Deitados vestidos em pele e pelo. Cheiro. Quadris guardados com pureza pelo lencol cujas rugas formam linhas que nos une. Uma cobertura despudorada, mas leve. Exalta os limites de tudo que eh exterior aos corpos. Eles se confundem, sao um novo corpo, unico, deformado, numa configuracao que nunca mais vai se repetir.
Pernas entrelacadas, os pes acariciam. Bracos cruzados tocam rosto e cabelo. Olhos fechados permitem embarcar nas sensacoes. Dedos seguem contornos, pelos, pele, cicatrizes, marcas da vida, coracao, respiracao. Descobrem e apreendem a imagem na fluidez da memoria, que faz os seus registros extremamente particulares. Atencao no toque, onde agora, o corpo de resume.
A lingua de textura e deformacao unica eh capaz de se moldar conforme o corpo, consegue investigar externamente minucias interiores. Traz sensacoes onduladas.
A energia da vida da sinais de sua existencia em liquidos escorregadios. Convidativo, agora, eh o massageamento por dentro. Corpo bailarino em sintonia, refletem, em sombra, a harmonia ritmica.
Corpo se converge inteiramente em sensacoes. Sem eu, sem voce, sem mente. So "O Corpo".

Alivio.

Um sobre o outro, respiracao e uma gargalhada." 


terça-feira, 18 de novembro de 2008

Aplicações do Princípio da Incerteza

Resumindo em uma frase o Princípio da Incerteza de Heisenberg, tem-se o seguinte: não se pode medir simultaneamente e com precisão a posição e a velocidade de um elétron, pois ao se medir uma das variáveis o valor da outra é modificado. Quando entrei na Física e soube disso, pensei: “- Como assim? Como uma Ciência com C maiúsculo, que explica tudo, pode enunciar um Princípio da Incerteza?”. Física quântica e epistemologia são coisas perturbadoras, e como troquei de curso, não terei mais certezas nem sobre a mecânica newtoniana.
Troquei porque entrei em choque ao me deparar com tantas fórmulas, princípios, leis, gráficos... Também tive dificuldade de me relacionar com 90% do curso: guris cabeludos que só ouviam Led Zeppelin, Iron Maiden e suas variações, assistiam Hermes e Renato e Jackass, e liam J.R.R. Tolkien, além de jogarem RPG. Nada contra, é que eu vinha de outro mundo e fui pega de surpresa. Mesmo assim eles me influenciaram (é compreensível, eu tinha 17 anos), e desenvolvi um certo gosto por este underground musical, além de roupas escuras e botas pesadas. Bom, ainda gosto muito de Led Zeppelin, mas refinei o resto.
Então fiz uma belíssima troca indo para as Ciências Sociais, um curso que todos conhecem, que dá um bom status, bons empregos, e que não provoca, de forma alguma, dúvidas existenciais sem fim. Se antes não me adaptava entre os nerds, agora não me adapto entre os militantes, os intelectuais de berço e teorias ainda mais incertas.
Só posso concluir que a desajustada sou eu. Mas esta constatação não incomoda tanto como outrora. Acho que desisti de buscar uma vida linear, com cada coisa em seu devido lugar. Convivo melhor com a incerteza agora, por falta de opção e através de algumas reflexões sobre isso. Neste momento prefiro não me adaptar a um curso, uma carreira, ou ao que quer que seja. É claro que isso é incômodo às vezes, mas me permite, ao mesmo tempo em que não tenho nada, ter espaço para muitas possibilidades. Estou me deixando surpreender, por coisas inesperadas, por sonhos velhos que só agora têm lugar,e pela própria falta de rumo que aponta novos caminhos. Concordo com a Luiza quando diz que as expectativas ofuscam a beleza da própria vivência. Então, estou tentando me livrar de uma pequena parte delas (tarefa ingrata...). Penso em todas estas coisas quando tenho uma vontade súbita de nascer de novo, numa família com pai, mãe e irmãos felizes, um cachorro, flores na frente da casa, férias em Torres, missa e almoço na vó aos domingos... e eu estaria agora cursando Direito ou Administração.
Perdoem o drama. É só uma tentativa de pensar algumas faltas e falar de uma certa saudade da vida tranqüila que não tive/terei.

sábado, 15 de novembro de 2008

(.)(.)(.)

Estou gostando de ver a multiplicidade de discursos que estão sendo veiculados pelo blog. Hoje venho falar um pouco, não teoricamente é claro, do que chamamos experiência. Sempre ouvi dizer que o futuro é um abismo de incertezas, dúvidas e possibilidades. Estar em um novo ambiente me ajuda a relativizar este ponto de partida tomado pela senhora que penteava meus cabelos em frente à lareira da Chácara Travessão e que, com todo o carinho, eu chamava de Vó. Não apenas hoje, mas há tempos, me vejo enredada na própria incerteza e ambigüidade que assume relevância apenas quando verbalizo tal vivência passada. Quero me tornar mais clara, mas deparo-me com a mesma guerra interna expressa pela Polli no que tange a necessidade de organizar o pensamento segundo a lógica de argumentos e construção gramatical próprios da língua portuguesa. Antecipo meus pedidos de desculpa e imploro paciência. :)

Pois... Andando pelas estreitas ruas lisboetas penso na vida vivida e questiono se realmente minha vida está sendo vivida. Sou movida pelas expectativas que, por sinal, norteiam todas as minhas ações. Expectativas brotam do presente, mas almejam o futuro. Se eu sou movida por expectativas, sou movida pela certeza do futuro, daquilo que busco ser, ter, construir. Alguns meses atrás eu almejava um intercâmbio e acreditava que eu poderia ter esta experiência, assim como fantasiava os dias em solo estrangeiro. Pode parecer infantil para quem algum dia saiu do Brasil, mas este não é o meu caso. Por fim, consegui. A cada passo que eu dou em direção à minha casa eu busco a excitação dos passos dados nas minhas fantasias passadas. Mas eu ando... penso... ando... ando... mais um passo... até parar em frente a velha porta verde da rua Gonçalves Crespo, número 27. Nenhum passo foi sentido como os passos que eu havia dado nas minhas ingênuas aventuras fantasiosas. Essa é a minha vida. Não é a incerteza do passo que me perturba, mas a falta de significado que ele carrega (ou talvez nem “a falta” ele carrega).

Tal como as vivencias passadas, sei o que acontecerá. Lisboa deixará saudades, não tenho dúvida. Os passos dados serão lembrados com aquele aperto no peito típico das boas recordações. E ao tornar concreto – em palavras – esta experiência aos colegas, amigos e familiares, a intensidade da experiência já finalizada será quase equivalente às expectativas feitas (em alguns casos serão contrárias, é verdade...eheheh). De resto, eu me questiono: afinal, eu vivo ou sou movida a lembranças e expectativas cristalizadas em ações que, por sinal, geram novas lembranças e expectativas que novamente levam a ações? Ou, mais ainda: desconheço-me tanto que não sei dizer o que sinto no momento da experiência, mas sei dizer o que senti quando o acontecimento teve fim. Refiro-me aos passos dados para chegar a casa, mas também as noites boêmias no bairro alto, as antigas sessões espíritas da casa da minha avó, a descoberta de ter passado no vestibular, a novidade do nascimento da minha sobrinha, o encontro de uma paixão, etc. As malditas expectativas tornam opaca a beleza da própria vivência... Em meio a estes pensamentos, eu sinto que pertenço ao próprio abismo de possibilidades de ações, imersa nas lembranças e sendo moldada por expectativas.

PS: Aceito livros de auto-ajuda e contatos pscioterapeuticos/ psiquiátricos :P

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

R.E.M. & Obama numa quinta épica

Valeu, Rodrigo, pela iniciativa brilhante de nos juntar nesse espaço de interação. Conheço alguns: Fernanda, Alex, Luiza. Outros não colocaram a foto e, de nome, não me recordo quem possam ser. De qualquer forma, espero conhecê-los algum dia.

Quero contar brevemente pra vocês sobre o show da banda R.E.M. que aconteceu quinta-feira passada e eu tive a grande satisfação em curtir. Os caras estavam num astral muito positivo. Curto a banda desde os 15 anos e desejava com todas minhas forças que eles viessem pra cá. Não sei dizer como isso de fato aconteceu, pois ainda parece um pouco onírico. Eu sei que eles tocaram no Estádio do Zequinha (aquele na Assis Brasil), e eu pulei feito animal. Antes do espetáculo, sem querer querendo, passei no Moinhos Shopping pra sacar a grana e descobri que o trio estava hospedado no Sheraton. Não tinha nenhum fã, nem groupie. Só polícia! Eu compareci ali na frente do saguão do hotel e recebi um aperto de mão deles por ter mencionado a vitória do Obama.
Fiquei desperto até as 3 da manhã para assistir o discurso do Barack na televisão. O que me deixou mais surpreso e até perplexo era ver os americanos tão emocionalmente desestabilizados e receptivos para o novo.
O Show foi marcado também pela comemoração da vitória de Barack Obama. A banda apoiou explicitamente a campanha do presidente eleito dos Yankees, que venceu graças a grande participação dos latino-americanos de todas as querências. A euforia tomou conta e isso é importante, embora no fundo a gente saiba que a diferença entre Republicanos e Democratas é tênue.


Amanhã minha querida avó estará completando seus 90 anos. Palmas para ela, por favor! hehe

Em tempo: o Eduardo Galeano estará na Feira do Livro nessa quinta feira, dia 13, às 19:30 hrs, no Centro Cultural Érico Veríssimo. Se não me engano, ele participa duma entrevista com o Ruy Carlos Ostermann que manja muito de literatura. Tá dado o recado!

Um abraço aos amigos,
Fernandez.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Danilo Pulga entrando no porta Prosas...

Ola amigos, amigos dos meus amigos, amigos.
Estreio nesse blogger com meus vicios de escrita, e sem a tecnica de um um estudante de comunicação escrita. Afinal não costumo escrever mto. Mas esse blogger me é mto inspirador, ja que posso escrever qualquer coisa.
Queria me apresentar, ja que para alguns companheiros de blogger nunca ouviram se quer falar de mim.
Sou um grande amigo do Kiko (Rogrigo Toniol), tive a aportunidade de fazer o colegial com esse garotinho, No estado de São Paulo no colegio Coc de osasco.
Tbm pude subir o pico das agulhas negras (parque do itacolomi - Sudeste do brasil) com ele e uma turma bem peculiar. Entre outras aventuras de classe, risadas, piadas, confissões e descobertas. Desde a ultima vez que lhe vi em janeiro de 2007 em porto alegre, onde Kiko me presentou a cidade dos gauchos e prestei vestibular na federal pra Biologia. Onde no final das contas acabei ingressando na UFV de viçosa minas gerais no curso de Engenharia Florestal.
Tbm tive o privilegio de conhecer, na minha epoca de cursinho em osasco, o Faustão (tbm integrante do porta prosas). Com ele fiz alguns "roles" por osasco e puder conversar bastante. Que por conhecidencia é um grande amigo de Kiko. Um bom menino. hehehe.
Por fim de apresentação vendo eu nesse final de periodo (final de semestre) intenso de provas, deveres e ócios a cumprir encontrar tempo para acessar a internet e dar uma prosiada. Ja q esse acesso eh dificil, deveras o fato de eu estar morando na roça, onde ainda não tenho o privilegio de ter nem uma internet disgada. Mas por compensação tenho tido o privilegio de não ter im bom sinal da globo em casa, deveras o fato de não ter uma antena parabolica.
Agora imagino vcs meus caros amigos, intediados com esse texto alto explicativo e cheio de porens, e pensando "puta que saco!". huahuahua.
É por isso que qro renomear esse meu texto e todos os outros que for escrever com o seguinte titulo: "Para os leitores com tempo e desinteresse". Não que meus textos não sejam interessantes, mas é que para apreciar certas "artes" (e isso se aplica a tudo na vida) devemos olhar sem pressa e sem interesse...
Enfim, tenho que partir, minha aula ja vai começar, ops ja começou. A todos um bom dia, boa tarde e boa noite!

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Antes de estrear neste espaço que promete ser muito interessante, quero dizer que nunca escrevi algo que mais pessoas lessem, além dos meus professores. Portanto, leiam com olhos bondosos. Quero escrever um pequeno trecho de um livro com que me deparei há um tempo já, mas que não esqueci, e nem poderia.

Mas antes gostaria de falar sobre algo que faço freqüentemente, que é me pôr entre aspas através das palavras de outros. Faço isso porque tenho uma mania meio chata, que é tentar sempre (se consigo, já é outra história) me expressar com palavras precisas e frases objetivas, com a pretensão ingênua de fazer caber um pensamento inteiro em uma frase.

Bom, às vezes dá certo. Por exemplo, quando conversava com minha terapeuta sobre certa dificuldade de falar, ela tentava me convencer de que não existem palavras tão exatas quanto eu gostaria, e que certas coisas são simplesmente inefáveis. Usando um argumento extremo para meu medo de não ser entendida, dizia ainda que nunca podemos ter a certeza de que há realmente um entendimento comum (óbvio, mas às vezes esqueço disso). Mas eu nunca desistia da busca por uma frase que exprimisse exatamente minhas inquietações. E depois de muitas voltas e aproximações com outras palavras, a tal frase surgia, provocando um grande alívio.

Não sei, fico pensando se um certo reducionismo é o preço que pago por esta suposta exatidão na expressão. Pra mim, significa que entendi finalmente o que quero dizer, um entendimento particular que é anterior à fala.

Tudo isso pra contar que uma das coisas que mais gosto é quando leio algo – um poema, uma frase, um texto – e penso que era exatamente aquilo que eu queria dizer, mas não conseguia ordenar meu pensamento. Aí vem a sensação de estar traduzida, quando me sinto menos sozinha no mundo das palavras.

E finalmente o trecho de que falei no início, de Clarice Lispector, escolhido pela beleza, pela tristeza, e claro, pela precisão:

“ - Quer um pedaço de sanduíche, Maca?

- O quê?

- Quer um pedaço de sanduíche?

- Muito agradecida, Glória, mas eu tenho um enjôo para comer porque quando eu era criança me deram um gato frito.

- Credo! E você comeu?

- Comi, eu não sabia! Parecia que eu tinha cometido um crime, parecia que eu tinha comido um anjo frito com asa e tudo!

- Credo!

- Ai, Glória, por favor, você me dá uma aspirina?

- Mas por que você me pede tanta aspirina, Maca? Não é pelo dinheiro não, mas pode fazer mal!

- Para eu não me doer!

- Hã??

- Para eu não me doer. É dentro.”

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Novidades de Portugal

Tal como o Alex, esta é a minha estréia no “Porta Prosas”. Venho trazer algumas novidades lusitanas calcadas em decepções de uma pobre menina sul-americana. Como uma boa “rapariga” que pretende desvendar o mundo, me inscrevo em uma bolsa oferecida pela UFRGS para ir para a cidade das sete colinas, Lisboa, estudar Antropologia. Penso eu, Portugal está tão próximo da França, porque não haveria de ser bom? Hehehehehe. Ledo engano...
A antropologia portuguesa é precária e, com o magnífico Bolonha, está piorando cada vez mais. As aulas têm duração de 1h30min e o curso é realizado em 3 anos. Os alunos não precisam defender um trabalho de conclusão, há apenas os trabalhos realizados em cada cadeira. Os núcleos de pesquisa não são grandes coisas... E parecem nem ao menos dialogar entre si (ou entre universidades). Há grandes antropólogos aqui, não digo que não, mas vejo que existe muita desorganização no que consiste ao campo da antropologia. Há uma organização (a APA – Associação Portuguesa de Antropologia), mas não vejo mobilização por parte dos professores e muito menos por parte dos alunos no que diz respeito a essa Associação. Por exemplo, em fevereiro vai acontecer um congresso na Universidade do Minho (ao norte de Portugal) com antropólogos brasileiros, portugueses e africanos. Perguntei para um colega se alguém estava pensando em organizar algum grupo de interessados para participar do congresso (este colega é bolsista de um grupo de pesquisa) e ele ficou me olhando e questionou se isso havia no Brasil, pois cá não se tem o costume de participar em congressos. Não há contato entre alunos de graduação e pós-graduação e há pouquíssimo envolvimento dos alunos de graduação em projetos de pesquisa.
Decepcionei-me. A menina do terceiro mundo acaba por perceber que a idéia de Europa como sendo o pólo do conhecimento precisa ser revista. E essa experiência está sendo fundamental para eu perceber isso e ver que as universidades brasileiras estão de parabéns! Podem não ter uma ótima infra-estrutura (nisso refiro-me basicamente aos cursos de Humanas, pois ignoro outros institutos). No entanto, em termos de produção acadêmica e consolidação do campo antropológico – muito bem estruturado, por sinal – o Brasil (e outros países sul-americanos) possuem um ótimo desempenho em comparação com as universidades portuguesas. Entre os Erasmus (intercambistas) que estou tendo contato conversei com Álvaro – chileno que está fazendo mestrado em Sociologia – e sua opinião em relação ao ensino português é a mesma. O mais engraçado é: além do ensino de Sociologia e Antropologia não serem muito bons, ainda há o fato de ter-se que pagar a universidade pública – a famosa propina.
Enfim, estou um “bocadinho” triste com as conclusões que estou tirando da minha estadia aqui. Acredito que a melhor experiência que terei é o desenvolvimento obrigatório da língua inglesa (para me comunicar com os erasmus) e a aprendizagem para controlar meus sentimentos e auto-conhecimento típico de uma experiência de intercâmbio. No convívio com portugueses fiquei pasma com algumas colocações que tenho ouvido. Um dos últimos absurdos que ouvi foi dito por uma colega de apartamento e se referia à Independência do Brasil. Dizia ela que, Dom Pedro I realizou a independência do Brasil por gostar muito de nossa terra. Devemos, pois, agradecer-lhe por ter nos dado a tão almejada Independência, estão entendendo? Ehehe. Bem percebem que a discussão durou longo tempo...
Ai, ai... Resta-me dizer que Brasil faz falta. Falta pelo calor do povo, falta pela intensidade dos aprendizados antropológicos que a UFRGS me proporcionava, falta pela vida cultural (com muitas programações gratuitas – pois aqui tudo se paga!), falta pela inexistência de preconceito, pois agora sinto na pele. Sim, brasileira é vista como prostituta – pela quantidade de imigrações de mulheres brasileiras para casas de prostituição -, independente do grau de instrução ou qualquer outra categoria que inevitavelmente criamos para os nossos preconceitos. A simples nacionalidade “brasileira” já é uma categoria preconceituosa na sociedade portuguesa. Infelizmente...
No mais, essas são as críticas, um pouco de angústias e saudades de uma sul-americana em terreno europeu.

domingo, 26 de outubro de 2008

Não era o que pensava publicar.

Bom, faço hoje minha estréia nesse espaço promissor que propõe o Rodrigo. Minha idéia era começar com um texto abrasador sobre conflitos subjetivos que me acometeram em relação a antropologia. Desisti. Não por falta de coragem, mas sim por algo muito pior: a falta de tempo. Deixo no ar, contudo, o suspense a respeito do teor das minhas angústias. Dentro de algum tempo,depositarei aqui todos os resíduos sangrentos dessa discussão de relação que tive com a antropologia em decorrência dos excessos da minha despedida de solteiro. Mas não se preocupem, somos, ainda, um casal apaixonado.
Pensei também em falar sobre as incertezas de regressar ao Brasil depois de seis meses morando em Montevideu. Relatar a situação extrema em que me encontrei quando, dias antes de empreender o regresso a nação riograndense, me dei conta de que minha terra natal representava dúvida e desamparo enquanto o país estrangeiro simbolizava, supostamente, olocus promissor de uma rotina amena e comodamente linear. Mas desisti também de empreender tal reflexão. Fica para depois.

Hoje, quero largar por aqui dois trechos (os dois últimos dias) do diário de campo de uma ida a Montevidéu no ano passado. Por quê? Não sei bem. O fato é que estava organizando alguns arquivos no meu computador, topei com essas linhas e achei que seria legal compartilhá-las.

6° dia em Montevidéu (20 de Julho)

Sexta-feira, 20 de julho. No Brasil os dois fatos bombásticos da semana já estavam consumados. Um acidente com avião da TAM aprofundava o “caos aéreo” e ACM (“último caudillo de la derecha brasileña”, segundo o diário “La República”), estava sendo enterrado ao lado do seu filho, Luiz Eduardo. Enquanto isso, eu almoçava num bar-restaurante da Rua Colonia e aproveitava o tempo livre para ler o jornal, que noticiava uma possível subida nos preços dos alimentos devido às geadas que prejudicaram as lavouras do Norte do Uruguai.

Saindo do restaurante, caminhei até a biblioteca do CLAEH, onde me esperavam os livros que selecionara para fotocopiar. Deixei meu passaporte com a bibliotecária como garantia para retirar material do acervo.

Num pequeno bar da rua Soriano, tirei os xerox que necessitava. Em trinta minutos estava de volta ao CLAEH para recuperar meu documento e restituir os livros. Agora teria que voltar ao “Hostal”, guardar as cópias e buscar o gravador para entrevistar Rinche, as 19h no “Sport Man”.

Usei o tempo vago entre as 15h30min e as 19h para tomar algumas fotografias. Na rua San José, as inscrições em um muro atraíram o olhar da minha câmera: “Tabaré, en dos años más de 50 mil se fueron del país Y?”. Quinhentos metros mais adiante, na Av. 18 de Julio, vi um grupo de 10 pessoas aglomeradas diante de uma vitrine. A maioria era jovem. Aproximei-me para ver o que tanto lhes chamava a atenção. Tratava-se de uma lista de vagas de emprego: mais uma foto emblemática. Na seqüência, fotografei as ruas vazias do “Barrio Sur”, as árvores desfolhadas que conferiam ao passeio ares melancólicos e dois meninos de rua que se mostraram muito curiosos com o que estava fazendo.

Cheguei ao bar “Sport Man” as 18h30min, pedi um café, preparei o gravador e me pus a anotar as percepções daquele dia. Uma senhora alta, olhos claros, óculos com aros escuros, cruzou a porta do bar por vota das 19h15min. Supus que fosse Rinche e não me enganei.

Rinche era imigrante Suíça. Após conhecer um Uruguaio na Espanha, se mudou ao “paisito”. Falava perfeito espanhol marcado pelo sotaque do Rio da Prata. Conversamos sobre “Idas y Vueltas”, o atendimento da organização a parentes de emigrados, os serviços prestados aos próprios imigrantes, as histórias de viagem dos que se foram, etc.Rinche manifestou um ponto de vista bem interessante sobre fronteiras e migrações, o qual poderá ser verificado com a leitura da entrevista transcrita.

Esta última entrevista simbolizava a etapa final da minha saída de campo a Montevidéu. Ainda na noite de sexta, fui a Cidade Velha, comi empanadas na rua Bartolomé Mitre e depois pedi uma garrafa de Patrícia no bar “Fracasados”. Concluído meu pequeno ritual, retornei ao “Hostal”, de onde sairia definitivamente às 11h de sábado, depois do café da manhã.

7° dia em Montevidéu (21 de Julho)

Partiria de volta a Porto Alegre as 20h. Deixei minha bagagem no depósito do Terminal de Tres Cruces ao meio dia. Decidi, então, aproveitar as horas que me restavam na Capital do Uruguai para tomar mais fotos e visitar calmamente algumas livrarias e feiras. Primeiro, fui a ruaFernández Crespo, reduto de comércio popular, sebos , venda de roupas usadas, contrabando, etc. Aquele é um dos poucos lugares, nas imediações do Centro, onde se pode encontrar CDs piratas. Comprei alguns discos:Zitarrosa; Joaquín Sabina; No te va a gustar; Cuarteto de Nos; Tabaré Cardozo. Depois, visitei a livraria “Puro Verso”, na Av. 18 de Julio. O mezanino deste estabelecimento comercial possui fartas estantes de livros de sociologia e antropologia. Entretanto, os preços não são nada convidativos, a ponto de coibirem os meus impulsos de consumo. O dinheiro que havia reservado para “consumir cultura” (me dói escrever tal expressão) foi investido num delgado livro de PierreBourdieu (“Sobre la Televisión): $250 (mais ou menos 25 reais). Tive vontade de levar outras obras, principalmente algumas coletâneas de ensaios antropológicos de autores argentinos. A magnitude dos preços, contudo, me pareceu inaceitável. Valeria muito mais a pena esperar alguns meses para viajar a Buenos Aires e comprar os mesmos exemplares por muitíssimo menos. Nunca deixo de surpreender-me com o valor dos livros e CDs no Uruguai. As quantias pedidas pelas publicações literárias e musicais naquele país extrapolam em muito o poder de compra da população, talvez de forma mais aberrante que no Brasil.

As 18h dei início a uma longa caminhada que terminaria em Tres Cruces. Era cinza e frio o sábado, as ruas estavam vazias. Aquela cidade melancólica era a Montevidéu das minhas lembranças; baixei a cabeça e caminhei devagar. Acreditei incorporar-me, assim, a paisagem.

Na rodoviária tomei meu último café no Uruguai. As 19h15min retirei a mochila do depósito, me dirigi ao balcão da EGA, fiz os trâmites de embarque e entrei na zona das plataformas. As 19h45min já estava acomodado no interior do ônibus. “Te esperamos a la vuelta” dizia o cartaz numa das paredes do Termial. O sono chegou rápido, antes mesmo de Punta del Este.

“Mamá, ya sé que no es uma ciudad pobre, pero es fea”, disse o menino uruguaio quando o ônibus se aproximava da Rodoviária de Porto Alegre, por volta das 7h50min da manhã de domingo. Chovia.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Pastel, pardais, feira e quinta-feira

Toda santa quinta-feira e toda quinta-feira santa, desde a mais profunda lembrança que tenho, ia a feira com meu avô depois do colégio comer pastel. Ali mesmo na feira do Jardim das Flores, nome a que meus ouvidos já estão desacostumados de ouvir, saboreava meu pastel. O sabor pouco importava, o que valia mesmo era dar uma mordida, abrir um pouco com a colherzinha e socar uma deliciosa mistura de vinagrete, mostarda e catchup pra dentro. A cada mordida os sabores se misturavam, o amargo da mostarda, o agridoce do catchup, o salgado da massa e até a falta de gosto da carne eram corados com um grande gole de caldo de cana!
Assim foram as quintas-feiras desde minhas remotas lembranças da vida escolar. Um belo dia (quem sabe até foi numa quinta-feira) alguém me disse que o Rio Grande do Sul era um lugar bom pra se morar e que talvez fazer vestibular ali fosse uma boa idéia... a proposta surtiu efeito e quando vi já estava com a inscrição feita e passagem comprada para fazer as provas aqui nas terras ao sul da América do Sul.

Cheguei por volta da meia noite, não podia enxergar direito as ruas e o taxista não entendia bem o que eu dizia e eu, que achava que entendia só piorava as coisas:

- Nossa, as ruas aqui tem poucos buracos né? - exclamei impressionado com a falta crateras nas pistas
- Bah, agora arrumaram e ficou bom, mas o que tem muito é "pardal" - respondeu o homem
- Ahh, mas que maravilha!! Até pardal tem aqui, na minha cidade isso é coisa do passado. - quando terminei a frase o sujeito me olhou com um ar 1/3 intrigado, 1/3 irritado e 1/3 arrependido por ter entrado no assunto comigo

Somente depois de um bom tempo morando aqui as coisas foram se esclarecer: pardal é o mesmo que radar!

Já naqueles dias de prova o lugar me impressionava: a falta de filas, o número de parques, o chimarrão, o tamanho das folhas dos jornais muito mais apropriados para pessoas que têm apenas dois membros superiores... Voltei encantado e decidido, vou morar no Rio Grande! A decisão foi tomada sem muita reflexão, o que talvez apenas ajude a entendê-la como a melhor que já tomei. Mas lamento por não ter conferido uma coisa, uma única coisa: a existência de pastel na feira. Sim caros leitores paulistas, aqui não tem pastel na feira! Estão chocados? O pior está por vir: aqui não tem feira! Os possíveis leitores gaúchos devem estar dizendo: "Tchê, o Rodrigo está louco! é claro que tem feira!" Está bem, vou descrever rapidamente aquilo que aqui chamam de feira e você, gaúchos e paulistas, tirem as conclusões. A feira no Rio Grande tem mais ou menos 15 metros de comprimento, ninguém fala alto, poucos são os que vão fazer as compras com carrinho e o pagamento pode ser feito com cartão de crédito! A menos que tenha mudado muito nestes dois anos, a feira que frequentava com meu avô era infinita, suja, barulhenta, você sempre tinha seu pé cortado por um carrinho desgovernado dirigido por uma velha, mas o principal: tinha pastel e caldo de cana!

Esse é apenas um desabafo escrito com desinteresse. A "falta de" ajuda a me situar, ajuda a entender que estou noutro lugar que não aquele das quintas-feiras...aqui o dia chave é a segunda, quando se come o carreteiro feito com as carnes que sobram do churrasco do domingo, mas este é outro assunto que voltarei assim que falar de outras duas faltas... da pizza e das padarias.

domingo, 19 de outubro de 2008

parece que a postagem anterior criou um efeito inibitório sobre a criação dos demais. não era essa minha intenção, mas como não medimos, ou julgamos, alguém pelas intenções e sim pelos atos, eu resolvi voltar e registrar aqui um pensamento que acabei de ter, algo para quebrar o gelo.

Hoje pela manhã, ao raiar do dia, acertei meus relógios para o horario de verão. Que segundo um conhecido meu, desses que só conversamos porque trabalhamos juntos, o horário de verão só serve para o carioca ter mais tempo de tomar sol na praia. Após acertar os relógios da casa fui-me deitar. A noite foi longa, cheia de gastos de energia, mas não posso revelá-los aqui. Dormi. Dormi muito.
Acordei, o sol já marcava o domingo como dia tedioso e pus-me a digitar lições aos alunos no computador. Imaginem meu estado: ressaca, roupa de ontem suja e suada, cabelos duros e fuziformes (quem me conhece entende), olhos semi-cerrados e por aí vai. Isso, vale lembrar que eu estava deitado... imaginaram? Nesse estado resolvi desfrutar do maior prazer que a internet me proporciona: ter vida "social" sem precisar escovar os dentes ou me arrumar, posso arrotar ou cortar as unhas do pé sem que ninguém me veja, mesmo conversando com eles pela internet, pelo msn.
Até então tudo bem, mas de repente alguem me mandou alguma coisa que eu precisava aceitar ou recusar. Como estava naquele estado de semi-consciencia turbinado pelo fato de ser domingo e de eu estar sozinho em casa, aceitei o tal convite. Em três segundos a imagem fétida de um cara aos vinte anos deitado no sofá de casa apareceu na tela do computador, e por um instante me vi de um outro ponto de vista. Então era assim que fico quando uso o computador? Isso por si só já provia uma conversa inteira e mais uma noite inteira de pensamentos sozinhos. mas o desespero de saber que a pessoa com quem eu falava também estava compartilhando daquela imagem me fez tentar desviar dos olhos da câmera enquanto tentava desliga-la. Consegui e é aqui que se instaurou o diálogo interno em mim.

Será que haverá de chegar um dia quando teremos que nos vestir, tal qual o fazemos hoje para sair, para usar a internet? credo. cada vez mais querem que meu particular se torne público! não sou famoso, mas estou cercado de câmeras que me filmam e fotografam meu carro.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

nada melhor, para começar, que a leitura livre de um livro célebre.

Leitura do livro da Gênese:
Então Deus, sozinho e, por isso, solitário, criou, no primeiro dia da criação, todas as coisas. No primeiro dia criou a luz, a escuridão, o frio e o quente, o duro e o mole, a água e a terra, tudo o que está sobre a terra e tudo o que está sob o mar e tudo o que está para cima da terra e tudo o que está para baixo do mar. Criou tudo, já separadinho, já no seu devido lugar. E Deus viu que tudo era bom.
No segundo dia de criação ele separou a beleza da feiúra e agora todas as coisas ou eram belas, ou eram feias. E Deus gostou, viu que era belo e viu também que era feio e gostou assim. No terceiro dia da criação separou o barulho do silêncio, então metade ficou sendo o barulho e metade ficou sem o barulho. Deus gostou das cosias assim. Na terceira noite separou o sonho do pesadelo e assim pode dormir sossegado. Deus viu que tudo o que fazia era bom.
No quarto dia acordou esquisito e separou a dor do carinho, sentiu-se bem, gostou do que fazia. No quinto dia definiu o que seria tristeza e o que seria alegria e ambas ele semeou na terra. Viu que a cada dia a criação se aproximava mais da perfeição e gostou muito disso. No sexto dia separou o bem do mal, o bom do ruim e o cheiroso do fedido e assim amava mais sua criação. Na sexta noite separou o pecado da graça embora tenha deixado em toda a graça o pecado adormecido. No sétimo dia resolveu descansar, mas o homem, pentelho, veio lhe incomodar.
No sétimo dia separou o homem de Deus e assim pode descansar.



E que o debutar seja leve para todos.